O dragão não é para ser deletado. Ele é necessário!
Sem o dragão não haveria iluminação, isto é
reconhecimento de nossa natureza última.
Como pode ser isso? o dragão não é aquilo que nos separa da Paz?
Quando as aflições e outros sofrimentos psicológicos nos atormentam, as
condições exteriores são apenas o gatilho.
Qualquer perturbação exterior é interpretada pelo pensamento e ativa a instabilidade intrínseca
do processo emocional, gerando temores e ansiedades,
mas nunca a tão desejada Paz — porque esta surge tão
somente ao sossegar do oceano tempestuoso que são as emoções e preocupações.
Não será por isso que Jesus disse: "Meu reino não é deste mundo"?
Mas é próprio do ser humano, desde tempos imemoriais,
apelar a um poder superior em suas aflições.
Vejamos alguns trechos do belo Salmo 34, de Davi:
Busquei ao Senhor, e ele me respondeu; livrou-me de todos os meus temores.
Clamou este pobre, e o Senhor o ouviu, e o salvou de todas as suas angústias.
Os versículos mostrados mostram claramente duas coisas:
1) que é nosso mecanismo mental que gera o medo, a angústia, a ansiedade
e todo o tormento de existir;
2) que há uma força superior a esse mecanismo perante a qual ele se desativa,
ficando em seu lugar o sentimento de bem-aventurança em nossa alma.
Quando Davi diz "este pobre", está aludindo a seu "eu", sem dúvida; pobre,
porque sem recursos
para fazer cessar o tormento interno causado pela mente, ou seja, calar o dragão.
Porque a mente é o dragão atormentador, feito de emoções, sensações e pensamentos.
Esses fatores, estimulados pelas condições, fogem ao controle do nosso "eu".
Temos portanto, de um lado, o "eu", e de outro, o dragão.
Mas o que é, em última instância, o "eu"? Já pensou nisso?
Com certeza, não é o conjunto das emoções, sensações e pensamentos,
que falham ao responder pelo principal fenômeno dos seres vivos:
ser consciente, ouvir um som,
saborear uma comida, etc. — a menos que você aceite que é o cérebro que o faz.
Pense nisso: quando você fica consciente
de um forte ruído, por exemplo, não é o pensamento,
nem a emoção nem a sensação que ficou consciente, embora essas coisas surjam logo em seguida.
— o pensamento tentará dizer do que se trata;
— uma sensação física de agrado ou desagrado
surgirá automaticamente;
— e, talvez, alguma emoção seja despertada (medo por exemplo).
Mas, com certeza, não é o pensamento que ouve o barulho; nem tampouco
a sensação ou a a emoção.
O que é ISTO QUE FICA CONSCIENTE, então?
Antes de dizer que é o cérebro, lembre-se do girassol, que gira delicadamente na direção da luz solar;
ou pesquise na Internet sobre plantas carnívoras,
como a dioneia e a drósera spatulata, que não possuem cérebro
mas SABEM quando apanham uma presa, assim como também demonstram extraordinária
inteligência quando da montagem de suas armadilhas.
De novo: o que é, então, ISTO QUE É CONSCIENTE?
E´ o SER que há em nós (e em tudo), e que se revela como Consciência Pura.
Nós não podemos conhecê-lo, como se fosse algo exterior a nós.
Mas podemos ser o SER, o que vem a ser a autêntica conversão religiosa.
Esta, entretanto, é raríssima, pois não nos oferece nenhum ganho no mundo material.
Como assim, podemos ser o SER? então já não O somos?
Sim, somos — mas não sabemos disso! e por quê? Acontece que Ele se encontra recoberto
pela memória, pelas descrições
e imagens das coisas do mundo, às quais nos apegamos, ou aborrecemos imensamente.
É como uma grande luz recoberta por uma fina tela, onde está projetada toda sorte de imagens
da experiência humana,
desde as sabedorias mais elevadas e as imagens sacras mais sublimes até as mais devassas representações
de todo tipo de depravação e
vícios — e também todos os terrores e ansiedades que assolam a humanidade.
E nossa atenção encontra-se hipnotizada exatamente por essas imagens,
que refletem a experiência humana ao longo dos milênios.
Essa mistura de memória e atenção gera o eu separado
(na mitologia judaico-cristã,
chama-se Lúcifer, o "Portador da Luz", o anjo caído).
Esse "eu", ou "ego", torna-se, assim, o grande obstáculo.
Mas é também aquele que, compreendendo a si mesmo,
poderá desvestir-se das roupagens do engano,
adquiridos em muitas existências; e, em sua nudez, reconhecer sua real Origem.
Quando o ego quer procurar a realidade transcendente (Deus) para ter saúde e bem-estar material,
o que o move é seu viés utilitarista, de interesse estritamente pessoal.
Melhor seria descobrir-se como um grande engodo cósmico e despir-se de suas máscaras!
O que é necessário é morrer para sua falsidade e fazer uma
intercessão sincera para que lhe seja retirado o véu que oculta a Realidade de onde veio.
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Agora, olhem para a imagem do lado direito: o que o dragão tem sob suas garras?
Uma pérola! Uma "pérola de grande valor".
Estará o espírito do Mongezinho prisioneiro do dragão?
Mesmo os mais bem intencionados podem estar laborando em erro:
talvez ainda sejam uma das infinitas faces do Portador da Luz.
Uma face contrita, sofrida, pois, ao meditar, ao orar, ao tentar se elevar,
eles têm o espírito aprisionado pelo dragão.
Sua devoção está sendo sabotada!
Por isso estão sempre em dúvida; por isso não
conseguem morrer para si mesmos.
Ainda estão sob o véu que esconde a Realidade.
O Espírito, que é Consciência Pura, jamais é aprisionado
—
mas nossa ATENÇÃO, que é uma emanação do
Espírito, essa SIM, está presa pelo dragão da mente.
Aprisionada, nossa atenção está sempre se projetando para fora, totalmente governada
pelas
emoções, sensações e pensamentos,
instrumentos do corpo para satisfação do prazer e fuga da dor.
Porém, esses instrumentos não têm poder em si mesmos: eles precisam de um eu-pensamento,
coisa que os animais não possuem, por isso não guardam raiva e a premeditação
de seus atos é de pequeno alcance.
O surgimento do eu pessoal é necessária mas crítica da longa noite da evolução humana.
A ideia de um pensador externo aos pensamentos é a base do eu pessoal; mas esse pensador É, ELE PRÓPRIO,
UM PENSAMENTO! Não existe tal suposta entidade exterior aos pensamentos!
Ao aceitar sua existência estamos recriando o PORTADOR DA LUZ, e isso é o coroamento da
MEMÓRIA mesclada à atenção, que é A FAGULHA DO DIVINO em todas as formas vivas.
Mas a evolução não pode se deter nesse ponto;
isso está levando os seres humanos
à bestificação
diante da tecnologia, que haverá de substituí-lo,
sem falar no emaranhado emocional que continua a dominar o pensamento e engendrar o ego,
o Portador da Luz — gerando crueldades e absurdos a que parecemos estar habituados,
e levando o planeta à destruição.
A questão que se coloca, então, é:
como libertar a atenção/espírito das garras do dragão?
Sim, pois nossa atenção está refém do
pensamento, sensação e emoção.
Escrava do pensamento, continuamente ela se projeta para fora,
em busca não somente de
subsistência mas também de prazeres,
fuga do sofrimento, e busca de sentido para a vida.
Para isso ocorrer, PRIMEIRO DE TUDO TEM QUE HAVER UM CHAMADO, que desperta o INTERESSE.
E uma grande força interior, pois quem entra nessse caminho é rejeitado pelo mundo.
Grandes sofrimentos deverão ser enfrentados.
Mas talvez o sofrimento sozinho não seja suficiente.
Penso que uma combinação de SOFRIMENTO, DEVOÇÃO E ESCLARECIMENTO
é o caminho da redenção do ser humano moderno, mais escravizado
e ignorante do que nunca.
Sempre houve, embora raríssimos, aqueles de sabedoria espontânea e natural devoção
à Luz do Universo,
e até mesmo identificados com ela, como Jesus, Buda, J. Krishnamurti e outros.
E também aqueles, igualmente raros, que foram transformados para
manter elevada comunhão com o Absoluto.
Penso que Davi teve o bastante para entregar seu caminho nas mãos de Deus:
"Entrega o teu caminho ao Senhor; confia nele, e o mais ele fará." (Salmo 37:5).
Por isso pôde dizer:
"Clamou este pobre, e o Senhor o ouviu, e o salvou de todas as suas angústias"
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